Newsletter nº 94 | Julho 2022

Nesta edição:

CVM promove alterações pontuais em nova regra de crowdfunding de investimento

Em 28.06.2022 a Comissão de Valores Mobiliários – CVM editou a Resolução CVM nº 158/2022, promovendo alterações pontuais na Resolução CVM nº 88/2022, norma que disciplina as ofertas públicas de valores mobiliários de emissão de sociedades empresárias de pequeno porte, realizadas com dispensa de registro por meio de plataforma eletrônica de investimento participativo (crowdfunding de investimento) (“Nova Resolução”).

A Resolução CVM nº 88/2022 consiste no novo marco regulatório do crowdfunding de investimento no Brasil e foi editada em 27.04.2022, como noticiado pela Newsletter Moreira Menezes, Martins Advogados nº 92 (maio de 2022). 

A reforma promovida pela Nova Resolução teve como objetivo atender a pleitos e questionamentos levantados por plataformas eletrônicas de investimento participativo após a edição da Resolução CVM nº 88/2022 e antes de sua entrada em vigor, em 01.07.2022.

Dentre as principais alterações trazidas pela Nova Resolução, destacam-se as seguintes:

(i) Possibilidade de limitação dos compradores dos valores mobiliários objeto de operações subsequentes

A Resolução CVM nº 88/2022 passa a prever expressamente, em seu art. 16, que as sociedades empresárias de pequeno porte (EPP) podem optar por limitar quem serão os potenciais compradores das operações subsequentes, de forma a permitir que apenas pessoas que já invistam na EPP possam adquirir os valores mobiliários de outro investidor que esteja buscando liquidez. 

Nesse caso, tal opção deverá ser informada pela plataforma eletrônica, na página da rede mundial de computadores destinada à oferta. Além disso, as condições e obrigações relacionadas aos investidores ativos devem ser lidas como se referindo a este universo menor de investidores.

(ii) Escrituração e controle de titularidade e de participação societária

O art. 53 Resolução CVM nº 88/2022 passa a prever que somente será exigível a obrigação de instituir controle de titularidade e participação societária ou de escrituração, conforme o caso, para os valores mobiliários objeto de ofertas públicas iniciadas após 90 dias contados da entrada em vigor da Resolução.

Ainda foi incluído parágrafo único para determinar que, durante esse período de 90 dias: (ii.1) o valor alvo máximo de captação não pode ser superior a R$ 5.000.000,00; (ii.2) não será permitida a realização de operações subsequentes com valores mobiliários.

A Resolução entrou em vigor em 28.06.2022.

Maiores informações, bem como a íntegra da Resolução, podem ser encontradas no site da CVM (www.gov.br/cvm).

Entra em vigor novo decreto que regulamenta a Lei Anticorrupção brasileira

Em 12.07.2022 foi publicado o Decreto nº 11.129/2022 (“Novo Decreto”), que regulamentando a Lei nº 12.846/2013, a qual dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira (“Lei Anticorrupção”). O Novo Decreto revogou o Decreto nº 8.420/2015 (“Decreto Revogado”), que até então regulamentava a Lei Anticorrupção.

O Novo Decreto especifica que a Lei Anticorrupção se aplica aos atos lesivos praticados: (i) por pessoa jurídica brasileira contra administração pública estrangeira, ainda que cometidos no exterior; (ii) no todo ou em parte no território nacional ou que nele produzam ou possam produzir efeitos; ou (iii) no exterior, quando praticados contra a administração pública nacional. Podem ser responsabilizadas de acordo com a Lei Anticorrupção as pessoas jurídicas que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, regularmente constituídas ou existentes de fato.

Dentre as principais alterações promovidas pelo Novo Decreto, em comparação com o Decreto Revogado, destacam-se as seguintes:

(i) Percentuais e fatores de dosimetria da pena de multa:

Assim como ocorria na vigência do Decreto Revogado, a sanção de multa é calculada com base em percentuais do faturamento bruto da pessoa jurídica, apurado no exercício anterior à instauração do Processo Administrativo de Responsabilização (PAR). Entretanto, os percentuais aplicáveis, de acordo com cada fator de dosimetria, bem como os próprios fatores de dosimetria, foram alterados por meio do Novo Decreto.

Nos termos do art. 22 do Novo Decreto, a multa aplicável passa a ser calculada pela soma dos valores correspondentes aos seguintes percentuais da base de cálculo: (i.1) até 4% em caso de concurso de atos lesivos; (i.2) até 3% em caso de tolerância ou ciência de pessoas do corpo diretivo ou gerencial da pessoa jurídica (na vigência do Decreto Revogado, o percentual aplicável para tal fator de dosimetria se limitava a 2,5%); (i.3) até 4% em caso de interrupção no fornecimento de serviço público, execução de obra ou entrega de bens ou serviços essenciais à prestação de serviços públicos ou no caso de descumprimento de requisitos regulatórios; (i.4) 1% para a situação econômica do infrator que apresente índices de solvência geral e de liquidez geral superiores a um e lucro líquido no último exercício anterior ao da instauração do PAR; (i.5) 3% em caso de reincidência (na vigência do Decreto Revogado, o percentual aplicável para tal fator de dosimetria era de 5%); (i.6) 1% a 5% a depender dos valores dos contratos afetados pelos atos lesivos, que variam de R$ 500.000,00 a R$ 250.000.000,00 (na vigência do Decreto Revogado, os valores dos contratos afetados variavam de R$ 1.500.000,00 a R$ 1.000.000.000,00).

Além dos fatores de majoração da multa, conforme dispõe o art. 23 do Novo Decreto, também foram alterados os fatores de diminuição, da seguinte forma: (i.1) diminuição de até 0,5% em caso de não consumação da infração (na vigência do Decreto Revogado, tal percentual era de até 1%); (i.2) diminuição de até 1% em caso de comprovação da devolução espontânea da vantagem auferida e ressarcimento dos danos resultantes do ato lesivo ou de inexistência de comprovação de vantagem auferida e danos resultantes do ato lesivo; (i.3) diminuição de até 1,5%, a depender do grau de colaboração da pessoa jurídica com a investigação ou a apuração do ato lesivo, independentemente do acordo de leniência; (i.4) diminuição de até 2% em caso de admissão voluntária pela pessoa jurídica; e (i.5) diminuição de até 5%, caso a pessoa jurídica possua e aplique um programa de integridade,

(ii) Escopo da investigação preliminar

O Novo Decreto aumentou o escopo e passou a prever novas regras e ritos para a investigação preliminar, procedimento de caráter sigiloso e não punitivo que visa colher indícios de atos lesivos à administração pública federal, para subsidiar a eventual instauração de PAR contra a pessoa jurídica investigada.

Ampliou-se o rol de diligências investigativas a serem adotadas para  elucidação dos fatos sob apuração, incluindo-se: (ii.1) proposição à autoridade instauradora da suspensão cautelar dos efeitos do ato ou do processo objeto da investigação; (ii.2) solicitação da atuação de especialistas com conhecimentos técnicos ou operacionais, de órgãos e entidades públicos ou de outras organizações para auxiliar na investigação; (ii.3) solicitação de informações bancárias sobre movimentação de recursos públicos, ainda que sigilosas; (ii.4) requisição, por meio da autoridade competente, do compartilhamento de informações tributárias da pessoa jurídica investigada, conforme previsto no Código Tributário Nacional; (ii.5) solicitação, ao órgão de representação judicial ou equivalente dos órgãos ou das entidades lesadas, das medidas judiciais necessárias para a investigação e o processamento dos atos lesivos, inclusive de busca e apreensão, no Brasil ou no exterior; ou (ii.6) solicitação de documentos ou informações a pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, nacionais ou estrangeiras.

(iii) Apresentação de defesa e pedido de produção de provas:

O prazo para apresentação de defesa escrita e pedido de produção de provas continua a ser de 30 dias contados da intimação da pessoa jurídica investigada, conforme já previa o Decreto Revogado. Contudo, o Novo Decreto inova ao estabelecer que o ato de intimação (i) facultará expressamente à pessoa jurídica a possibilidade de apresentar informações e provas que subsidiem a análise relativa aos elementos que atenuem o valor da pena de multa; e (ii) solicitará a apresentação de informações e documentos, nos termos estabelecidos pela Controladoria-Geral da União, que permitam a análise do programa de integridade da pessoa jurídica em questão.

(iv) Acordo de leniência

Quanto ao acordo de leniência, o Novo Decreto o define como ato administrativo negocial decorrente do exercício do poder sancionador do Estado, que visa à responsabilização de pessoas jurídicas pela prática de atos lesivos contra a administração pública nacional ou estrangeira. O parágrafo único do art. 32 estabelece os objetivos buscados pelo acordo de leniência, quais sejam: (iv.1) o incremento da capacidade investigativa da administração pública; (iv.2) a potencialização da capacidade estatal de recuperação de ativos; e (iv.3) o fomento da cultura de integridade no setor privado.

Além disso, o Novo Decreto determina que ato conjunto do Ministro de Estado da Controladoria-Geral da União (“CGU”) e da Advocacia-Geral da União (“AGU”) (i) disciplinará a participação de membros da AGU nos processos de negociação e de acompanhamento do cumprimento dos acordos de leniência; e (ii) disporá sobre a celebração de acordos de leniência pelo Ministro de Estado da CGU em conjunto com o Advogado-Geral da União.

Também foram impostos deveres adicionais à pessoa jurídica que pretenda celebrar acordo de leniência, como, por exemplo, a reparação integral da parcela incontroversa do dano causado; ou a perda, em favor do ente lesado ou da União, conforme o caso, dos valores correspondentes ao acréscimo patrimonial indevido ou ao enriquecimento ilícito direta ou indiretamente obtido pela infração.

A proposta de celebração do acordo de leniência deverá ser feita necessariamente de forma escrita. Desse modo, foi excluída a possibilidade de realização da proposta de forma oral, conforme permitia o Decreto Revogado. A negociação relativa à proposta do acordo de leniência deverá ser concluída no prazo de 180 dias, contado da data de assinatura de memorando de entendimentos entre as partes e prorrogável por igual período.

A celebração do acordo de leniência interrompe a prescrição quanto aos atos ilícitos objeto do acordo. O prazo prescricional ficará suspenso até que sejam cumpridos os compromissos firmados no acordo ou até a sua rescisão.

As disposições do Novo Decreto aplicam-se imediatamente aos processos em curso, excetuados os atos praticados antes de sua vigência (que se iniciou em 18.07.2022).

Maiores informações, bem como o inteiro teor do Novo Decreto, podem ser encontradas no portal “Planalto” do site do Governo Federal (https://www.gov.br/planalto).

CVM edita resoluções sobre ofertas públicas de distribuição de valores mobiliários

Em 13.07.2022 a Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”) editou as Resoluções CVM nº 160/2022, nº 161/2022, nº 162/2022 e nº 163/2022 (em conjunto, “Resoluções”), que versam sobre ofertas públicas de distribuição de valores mobiliários.

As Resoluções são provenientes das discussões promovidas no âmbito da Audiência Pública SDM nº 02/2021. Além disso, o tema das ofertas públicas de distribuição de valores mobiliários constitui um dos focos da Agenda Regulatória da CVM para o ano de 2022. A reforma do arcabouço regulatório de ofertas públicas de valores mobiliários buscou implementar maior previsibilidade, agilidade e segurança jurídica para as ofertas públicas.

Nesse contexto, destacam-se abaixo as matérias reguladas por cada Resolução:

(i) Resolução CVM nº 160/2022: dispõe sobre as ofertas públicas de distribuição primária ou secundária de valores mobiliários e a negociação dos valores mobiliários ofertados nos mercados regulamentados, revogando as Instruções CVM nº 400/2003 e nº 476/2009;

(ii) Resolução CVM nº 161/2022: dispõe sobre o registro de coordenadores de ofertas públicas de distribuição de valores mobiliários e sobre as regras, procedimentos e controles internos a serem observados na intermediação de tais ofertas;

(iii) Resolução CVM nº 162/2022: promove alterações em diversas instruções e resoluções da CVM em vigor, adaptando-as às novas Resoluções; e

(iv) Resolução CVM nº 163/2022: dispõe sobre a oferta pública de distribuição de nota promissória, revogando a Instrução CVM nº 566/2015, que tratava desse mesmo tema.

Dentre as principais alterações promovidas em relação ao regime anterior, destacam-se as seguintes: 

(i) a Resolução CVM nº 160/2022 instituiu o chamado “rito de registro automático de distribuição”, nas quais o registro da oferta não se sujeita à análise prévia da CVM e pode ser realizada automaticamente, visando conferir maior flexibilidade e agilidade ao procedimento de registro nessas hipóteses específicas. Em razão da criação do rito de registro automático, o novo arcabouço regulatório não prevê mais as chamadas “ofertas públicas de esforços restritos”, atualmente previstas na Instrução CVM nº 476/2009, uma vez que as principais vantagens de tal modalidade de oferta pública foram contempladas e ampliadas pelo rito de registro automático;

(ii) enquadram-se no rito de registro automático de distribuição as ofertas públicas iniciais de distribuição de ações, bônus de subscrição, debêntures conversíveis ou permutáveis em ações e de certificados de depósito sobre estes valores mobiliários de emissores registrados em fase operacional quando o requerimento de registro for previamente analisado por entidade autorreguladora autorizada pela CVM (art. 26, I da Resolução CVM nº 160/2022);

(iii) a Resolução CVM nº 160/2022 estabelece definição mais precisa e restrita de “oferta pública de distribuição”, conceituando-a como “o ato de comunicação oriundo do ofertante, do emissor, quando este não for o ofertante, ou ainda de quaisquer pessoas naturais ou jurídicas, integrantes ou não do sistema de distribuição de valores mobiliários, atuando em nome do emissor, do ofertante ou das instituições intermediárias, disseminado por qualquer meio ou forma que permita o alcance de diversos destinatários, e cujo conteúdo e contexto representem tentativa de despertar o interesse ou prospectar investidores para a realização de investimento em determinados valores mobiliários […]” (art. 3º);

(iv) a Resolução CVM nº 160/2022 passa a contemplar modelos de prospecto categorizados de acordo com o tipo de valor mobiliário ofertado, incluindo os seguintes: prospecto de ações, de dívida, de fundos fechados, de fundos de investimento em direitos creditórios e de securitização;

(v) a Resolução CVM 160/2022 amplia as hipóteses em que títulos de securitização podem se beneficiar do rito de registro automático de distribuição, como por exemplo nos casos de oferta pública de distribuição de títulos de securitização emitidos por companhias securitizadoras registradas na CVM, destinados exclusivamente a investidores profissionais e qualificados (art. 26, VIII);

(vi) o conceito de “investidor institucional” é substituído pelo conceito de “investidor profissional”, conceito já existente na regulamentação vigente (art. 11 da Resolução CVM nº 30/2021);

(vii) foi aumentado para 25% o lote adicional da oferta pública de distribuição, substituindo o percentual anterior de 20% previsto na Instrução CVM nº 400/2003. Dessa forma, a quantidade de valores mobiliários a ser distribuída pode, a critério do ofertante e sem a necessidade de novo requerimento ou de modificação dos termos da oferta, ser aumentada, até um montante que não exceda em 25% a quantidade inicialmente requerida. No que tange às ofertas destinadas exclusivamente a investidores profissionais, fica dispensado esse limite de 25%, devendo ser especificados nos documentos da oferta tanto o valor máximo do lote adicional quanto a destinação dos recursos adicionais; e

(viii) a Resolução CVM nº 160/2022 passa a contemplar também a sociedade com propósito de aquisição de companhia (“SPAC”), definindo-a como emissora em fase pré-operacional constituída com a finalidade exclusiva de participar futuramente no capital social de sociedade operacional pré-existente (art. 2º, XXII). A norma prevê que a negociação em mercados regulamentados de valores mobiliários emitidos por SPACs somente pode ser realizada entre investidores qualificados, cessando tal restrição após decorridos seis meses da operação societária que tenha resultado na combinação de negócios entre a SPAC e a sociedade operacional (art. 85).

As Resoluções entram em vigor a partir de 02.01.2023, devendo-se observar, contudo, a ressalva do art. 100, parágrafo único da Resolução CVM nº 160/2022, que dispõe que as ofertas que estejam em curso naquela data serão regidas, inclusive no que tange às restrições à negociação em mercado secundário dos valores mobiliários ofertados, pelas normas vigentes (i) na data do protocolo do requerimento de registro; ou (ii) na data em que informado o início da oferta, no caso de ofertas isentas de registro.

Maiores informações, bem como a íntegra das Resoluções, podem ser encontradas no site da CVM (www.gov.br/cvm).

Jurisprudência

Superior Tribunal de Justiça

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 1.012. EXECUÇÃO FISCAL. BLOQUEIO DE VALORES DO DEVEDOR VIA SISTEMA BACENJUD ANTERIOR À CONCESSÃO DE PARCELAMENTO FISCAL. MANUTENÇÃO DA CONSTRIÇÃO. PRECEDENTES. REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA DESTA CORTE. SUPERVENIENTE PREJUDICIALIDADE DO RECURSO ESPECIAL QUE NÃO IMPEDE A FIXAÇÃO DA TESE RELATIVA À QUESTÃO JURÍDICA AFETADA AO RITO DOS REPETITIVOS. INTELIGÊNCIA DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 998 DO CPC/2015. 

1. As questões relativas aos requisitos de admissibilidade e abrangência de argumentação e discussão da questão a ser decidida foram analisadas pela Primeira Seção desta Corte no acórdão de fls. 209-210 e-STJ, na forma dos arts. 256-I e 257-A, § 1º, do RISTJ, tendo sido afetados e considerados aptos a representar a controvérsia o REsp 1.756.506/PA, o REsp 1.696.270/MG e o REsp 1.703.535/PA, para fins de fixação da tese jurídica para os efeitos dos arts. 927, III, 1.039 e seguintes do CPC/2015, cujo objeto é a definição da seguinte questão: “possibilidade de manutenção de penhora da valores via sistema BACENJUD no caso de parcelamento do crédito fiscal executado (art. 151, VI, do CTN)”. Por ocasião do acórdão de afetação foi determinada a suspensão dos processos sobre o tema em todo o território nacional, inclusive os que tramitam nos juizados especiais.

2. A jurisprudência consolidada desta Corte, a qual se pretende reafirmar, mantendo-a estável, íntegra e coerente, na forma do art. 926 do CPC/2015, admite a manutenção do bloqueio de valores via sistema BACENJUD realizado em momento anterior à concessão de parcelamento fiscal, seja em razão de expressa previsão, na legislação do parcelamento, de manutenção das garantias já prestadas, seja porque, ainda que não haja tal previsão na legislação do benefício, o parcelamento, a teor do art. 151, VI, do CTN, não extingue a obrigação, apenas suspende a exigibilidade do crédito tributário, mantendo a relação jurídica processual no estado em que ela se encontra, cuja execução fiscal poderá ser retomada, com a execução da garantia, em caso de eventual exclusão do contribuinte do programa de parcelamento fiscal. Nesse sentido: AgInt no REsp 1.864.068/SC, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 18/12/2020; REsp 1.701.820/SP, Min. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 19/12/2017; AgInt no REsp 1.379.633/PB, Rel. Ministro Gurgel De Faria, Primeira Turma, DJe 15/12/2017; AgInt no REsp 1.488.977/RS, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 03/08/2017; AgInt no REsp 1.614.946/DF, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 29/03/2017; AgRg nos EDcl no REsp 1.342.361/PE, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 04/10/2016; AgInt no REsp 1.596.222/PI, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 30/09/2016; REsp 1.229.028/PR, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 18/10/2011; AgRg no REsp 1.249.210/MG, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 24/06/2011. 

3. Não prospera o argumento levado a efeito pelo Tribunal de origem, bem como pela Defensoria Pública da União em sua manifestação como amicus curiae, no sentido de diferenciar o dinheiro em depósito ou aplicação financeira, bloqueado via sistema BACENJUD, dos demais bens passíveis de penhora ou constrição, visto que não há diferenciação em relação ao bem dado em garantia na legislação que trata da manutenção das garantias do débito objeto do parcelamento fiscal, não cabendo ao intérprete fazê-lo, sob pena de atuar como legislador positivo em violação ao princípio da separação dos poderes. 

4. Se o bloqueio de valores do executado via sistema BACENJUD ocorre em momento posterior à concessão de parcelamento fiscal, não se justifica a manutenção da constrição, devendo ser levantado o bloqueio, visto que: (i) se o parcelamento for daqueles cuja adesão exige, como um dos requisitos, a apresentação de garantias do débito, tais requisitos serão analisados pelo Fisco no âmbito administrativo e na forma da legislação pertinente para fins de inclusão do contribuinte no programa; e (ii) a suspensão da exigibilidade do crédito fiscal pelo parcelamento (já concedido) obsta sejam levadas a efeito medidas constritivas enquanto durar a suspensão da exigibilidade do crédito, no caso, na vigência do parcelamento fiscal. Tal orientação já foi consolidada pela Primeira Seção desta Corte, em sede de recurso especial repetitivo, nos autos do REsp nº 1.140.956/SP, de relatoria do eminente Ministro Luiz Fux, DJe 3/12/2010. 

5. Tese jurídica fixada para os fins dos arts. 927, III, 1.039 e seguintes do CPC/2015: O bloqueio de ativos financeiros do executado via sistema BACENJUD, em caso de concessão de parcelamento fiscal, seguirá a seguinte orientação: (i) será levantado o bloqueio se a concessão é anterior à constrição; e (ii) fica mantido o bloqueio se a concessão ocorre em momento posterior à constrição, ressalvada, nessa hipótese, a possibilidade excepcional de substituição da penhora online por fiança bancária ou seguro garantia, diante das peculiaridades do caso concreto, mediante comprovação irrefutável, a cargo do executado, da necessidade de aplicação do princípio da menor onerosidade. 

6. Dispositivo: Julgo prejudicado o recurso especial da FAZENDA NACIONAL em razão da superveniente perda de objeto decorrente da extinção da execução fiscal em face do pagamento do débito pelo então devedor.

(STJ. Primeira Seção. REsp nº 1.696.270/MG. Rel.: Min. Mauro Campbell Marques. Data de julgamento: 08.06.2022. Data de publicação: 14.06.2022)

A Newsletter Moreira Menezes, Martins Advogados é uma publicação exclusivamente informativa, não devendo ser considerada, para quaisquer fins, como opinião legal, sugestão ou orientação emitida pelo Escritório.

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