Newsletter nº 93 | Junho 2022
Nesta edição:
Decreto estabelece bases para mercado brasileiro de créditos de carbono
Em 19.05.2022 foi publicado o Decreto nº 11.075/2022, que estabelece os procedimentos para a elaboração dos Planos Setoriais de Mitigação das Mudanças Climáticas (“Planos Setoriais”) a que se refere o art. 11, parágrafo único, da Lei nº 12.187/2009. O mesmo Decreto institui, ainda, o Sistema Nacional de Redução de Emissões de Gases de Efeito Estufa (“Sinare”), cuja finalidade é servir de central única para o mercado brasileiro de créditos de carbono.
A referida Lei nº 12.187/2009 instituiu a Política Nacional sobre Mudança do Clima, determinando que o Poder Executivo estabeleça Planos Setoriais visando à consolidação de uma economia de baixo consumo de carbono nos seguintes setores:
(i) geração e distribuição de energia elétrica;
(ii) transporte público urbano;
(iii) sistemas modais de transporte interestadual de cargas e passageiros;
(iv) indústria de transformação e de bens de consumo duráveis;
(v) indústria química fina e de base;
(vi) indústria de papel e celulose;
(vii) mineração;
(viii) indústria da construção civil;
(ix) serviços de saúde; e
(x) agropecuária.
Por sua vez, o Decreto nº 11.075/2022 atribuiu ao Ministério do Meio Ambiente, ao Ministério da Economia e aos Ministérios setoriais relacionados, quando houver, a competência para proposição dos Planos Setoriais, que deverão ser aprovados pelo Comitê Interministerial sobre a Mudança do Clima e o Crescimento Verde (“CIMV”), instituído na forma do Decreto nº 10.845/2021 (cujo art. 1º determina que o CIMV tem a finalidade de estabelecer diretrizes, articular e coordenar a implementação das ações e políticas públicas brasileiras relativas à mudança do clima).
Os Planos Setoriais deverão estabelecer metas gradativas de redução de emissões e remoções por sumidouros de gases de efeito estufa, observado o objetivo de longo prazo de neutralidade climática assumido pelo Brasil enquanto signatário do Acordo de Paris. Essas metas serão monitoradas por meio da apresentação de inventários periódicos pelos agentes integrantes dos setores acima listados (“Agentes Setoriais”), a serem definidos nos respectivos Planos de cada setor.
Além disso, os prazos e as regras de atualização dos Planos Setoriais deverão observar os compromissos assumidos pelo Brasil no Acordo de Paris. Não obstante, os Planos Setoriais poderão estabelecer cronogramas diferenciados para adesão dos Agentes Setoriais integrantes do Sinare e definir tratamento diferenciado para esses agentes considerando, dentre outros critérios: (i) a categoria das empresas e propriedades rurais; (ii) o faturamento; (iii) os níveis de emissão; (iv) as características do setor econômico; e (v) a região de localização.
O Decreto estabelece, ainda, que o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões constitui mecanismo de gestão ambiental e será instrumento de operacionalização dos Planos Setoriais, devendo servir como ferramenta de implementação dos compromissos de redução de emissões mediante a utilização e transação dos créditos de carbono que tenham sido registrados no Sinare (“Créditos Certificados”).
Nesse sentido, o Sinare funcionará como central única de registro de emissões, remoções, reduções e compensações de gases de efeito estufa e de atos de comércio, transferências, transações e aposentadoria de Créditos Certificados.
O Sinare será operacionalizado pelo Ministério do Meio Ambiente, disponibilizado em ferramenta digital e terá como instrumentos: (i) o registro integrado de emissões, reduções e remoções de gases de efeito estufa e de atos de comércio, transferências, transações e aposentadoria de Créditos Certificados; (ii) os mecanismos de integração com o mercado regulado internacional; e (iii) o registro do inventário de emissões e remoções de gases de efeito estufa.
Na mesma linha, o Sinare também possibilitará, sem a necessidade de geração de Créditos Certificados, o registro de (i) pegadas de carbono de produtos, processos e atividades; (ii) carbono de vegetação nativa; (iii) carbono no solo; (iv) carbono azul; e (v) unidade de estoque de carbono.
Por fim, o Decreto nº 11.075/2022 dispõe que os setores que devem ser objeto de Planos Setoriais poderão apresentar, no prazo de 180 dias contados da data de sua publicação, prorrogável por igual período, suas proposições para o estabelecimento de curvas de redução de emissões de gases de efeito estufa, considerado o objetivo de longo prazo de neutralidade assumido pelo Brasil no Acordo de Paris.
Maiores informações, bem como o inteiro teor do Decreto nº 11.075/2022, podem ser encontradas no portal “Planalto” no site do Governo Federal (www.gov.br/planalto).
STJ julga caso sobre responsabilidade de sócios de microempresa por débitos fiscais após baixa no CNPJ
Em 03.05.2022 a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ, por unanimidade, deu provimento ao Recurso Especial nº 1.876.549/RS (“REsp. nº 1.876.549/RS”), interposto pela Fazenda Nacional contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que havia indeferido o redirecionamento da execução fiscal aos sócios da sociedade contribuinte classificada como microempresa.
Nos termos do acórdão recorrido, a execução fiscal direcionada à microempresa dizia respeito a fatos geradores ocorridos durante a vigência dos §§ 3º e 5º do art. 9º, da Lei Complementar nº 123/2006 (atualmente revogados), que estabeleciam responsabilidade solidária de sócios e administradores pelos débitos tributários da sociedade em caso de baixa de seus registros com pendências tributárias, previdenciárias ou trabalhistas.
No entanto, ainda nos termos do acórdão recorrido, a responsabilidade dos sócios não deveria ser reconhecida no caso, tendo em vista não ter sido comprovada qualquer uma das hipóteses do inciso III do art. 135 do CTN (ato dos sócios gestores com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos).
No âmbito do REsp. nº 1.876.549/RS, a Fazenda Nacional requereu a reforma do acórdão recorrido com base nos seguintes fundamentos:
(i) ao promoverem a baixa simplificada da sociedade perante os órgãos de controle sem a comprovação da regularidade fiscal, os sócios passariam a responder solidariamente pelas dívidas fiscais pendentes, nos expressos termos dos §§ 3º e 5º do art. 9º, da Lei Complementar nº 123/2006, conforme redação vigente à época;
(ii) o caso não dizia respeito a situação de dissolução irregular e, portanto, não seriam aplicáveis os entendimentos doutrinários e jurisprudenciais construídos em torno da interpretação e da aplicação do art. 135 do CTN – razão pela qual não haveria necessidade de se verificar a ocorrência de eventual ato ilícito dos sócios (excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos); e
(iii) a responsabilidade em análise no caso concreto deveria ser considerada solidária e independeria da prática de qualquer ato ilícito, não podendo ser confundida com as hipóteses dos arts. 134, VII, e 135, III, do CTN.
A Segunda Turma do STJ deu provimento ao REsp nº 1.876.549/RS, reconhecendo a possibilidade de redirecionamento da execução aos sócios.
No entendimento da Segunda Turma, o caso em questão não poderia ser enquadrado na hipótese de dissolução irregular (art. 135 do CTN), uma vez existir no regramento das micro e pequenas empresas a possibilidade de dissolução regular da sociedade, ainda que com pendências fiscais, previdenciárias e/ou trabalhistas. Tal faculdade teria sido incluída no sistema jurídico brasileiro para facilitar o término das atividades da pessoa jurídica, mas não para permitir o inadimplemento de dívidas fiscais.
Nos termos do voto proferido pelo Relator, Ministro Mauro Campbell Marques, tanto a redação original do art. 9º da Lei Complementar nº 123/2006, como aquela dada pela Lei Complementar nº 147/2014, devem ser interpretadas no sentido de que, no caso de micro e pequenas empresas, é possível a responsabilização dos sócios pelo inadimplemento do tributo, com base no art. 134, VII, do CTN, quando a sociedade tiver sido extinta.
Contudo, poderá sempre o sócio demonstrar a insuficiência do patrimônio da sociedade quando da liquidação para exonerar-se da responsabilidade pelos débitos, em linha com a jurisprudência do STJ.
Maiores informações, bem como o inteiro teor do acórdão proferido no REsp. nº 1.876.549/RS, podem ser encontrados no site do STJ (www.stj.jus.br).
Colegiado da CVM reconsidera decisão a respeito do tratamento contábil conferido à distribuição de valores a cotistas de FII quando tais valores excederem o lucro apurado pelo regime de competência
Em 17.05.2022 foi divulgada ata de reunião do Colegiado da Comissão de Valores Mobiliários – CVM na qual foi decidido o pedido de reconsideração apresentado por BTG Pactual Serviços Financeiros S.A. DTVM – BTG (“Requerente”), na posição de administradora do Maxi Renda Fundo de Investimento Imobiliário (“Fundo”), contra a decisão do Colegiado da CVM proferida em 21.12.2021 (esta última a “Decisão Recorrida”).
Proferida em dezembro de 2021, a Decisão Recorrida havia dado provimento parcial ao recurso interposto pelo BTG contra o entendimento da Superintendência de Supervisão de Securitização – SSE de que os rendimentos do Fundo somente poderiam ser distribuídos aos cotistas quando verificada a existência de lucro contábil (no próprio exercício ou acumulado de exercícios anteriores) (Ref.: Processo SEI nº 19957.006102/2020-10).
No caso concreto, a Requerente, com fundamento no parágrafo único do art. 10 da Lei nº 8.668/1993, vinha distribuindo aos cotistas do Fundo, a título de rendimentos, valores calculados com base no regime de caixa, mesmo quando tais valores excediam aqueles reconhecidos contabilmente como lucro do exercício e/ou acumulados. Por meio dessa prática, o valor “excedente” distribuído aumentaria a rubrica de prejuízos acumulados do Fundo de forma recorrente.
No âmbito da Decisão Recorrida, o Colegiado da CVM estabeleceu que a Requerente poderia realizar a distribuição de tais valores aos cotistas do Fundo. Contudo, foi determinado que a distribuição de rendimentos superiores aos lucros contábeis apurados ou acumulados não deveria ser classificada nas demonstrações financeiras como “rendimentos”, mas sim como “amortização de cotas” ou “devolução de capital aos cotistas”.
Nesse contexto, no dia 27.01.2022, a CVM divulgou nota, na qual consignou que a Decisão Recorrida “envolveu um caso específico. Contudo, o entendimento ali manifestado, pode se aplicar aos demais fundos de investimento imobiliário que tenham características similares ao do caso analisado”.
Em seu pedido de reconsideração, a Requerente apontou que a nova classificação contábil determinada na Decisão Recorrida “traz não apenas riscos jurídicos, como também implicações operacionais, financeiras, de governança, de gestão de liquidez, e até mesmo tributárias, no contexto de uma distribuição de rendimentos/patrimônio”.
Ao analisar o pedido formulado pela Requerente, o Colegiado da CVM, por unanimidade, decidiu reconsiderar a Decisão Recorrida, reconhecendo a regularidade da classificação da distribuição de “lucro caixa excedente” como “prejuízos/lucros acumulados”, e não como amortização de cotas integralizadas ou devolução de capital.
O Diretor Presidente Marcelo Barbosa e a Diretoria Flávia Perlingeiro pontuaram que o cerne da controvérsia seria a lacuna do parágrafo único do art. 10 da Lei nº 8.668/1993, que “emprega terminologia imprecisa, com potencial de gerar tratamentos significativamente distintos” quando se refere aos “lucros auferidos, apurados segundo o regime de caixa, com base em balanço ou balancete semestral”, sem deixar claro como a distribuição desse “lucro caixa” deve ser tratada contabilmente.
Adicionalmente, o Colegiado da CVM também orientou a Recorrente a promover aprimoramentos informacionais nas demonstrações financeiras do Fundo, de modo a assegurar aos investidores maior clareza de que tal parcela da distribuição de “lucro caixa excedente” foi superior ao lucro contábil, quando for o caso.
Conforme consignado na decisão mais recente, o Colegiado indicou que esse aprimoramento pode ser feito por meio da criação de subcontas na linha do patrimônio líquido relativa aos “lucros/prejuízos acumulados” segregando a distribuição de lucro que correspondeu a lucro contábil distribuído e a distribuição do “lucro caixa excedente” (se houver) distribuído com fundamento na Lei nº 8.668/1993, com correspondente nota explicativa com maiores informações a respeito de tais valores.
Adicionalmente, o Colegiado informou que a administradora do Fundo deve disponibilizar maiores detalhes a esse respeito nos avisos ou informes enviados aos cotistas, bem como esclarecimentos quanto aos riscos envolvidos.
Por fim, foi consignado pelos membros do Colegiado que essa questão informacional deverá ser submetida à pauta regulatória da Autarquia, para fins de padronização e aprimoramento das regras aplicáveis, no âmbito de revisão geral da Instrução CVM n° 516/2011.
Maiores informações, bem como a íntegra das decisões do Colegiado da CVM no Processo SEI nº 19957.006102/2020-10, podem ser encontradas no site da CVM (www.gov.br/cvm).
STJ define parâmetros sobre o prosseguimento de execuções individuais após o encerramento da recuperação judicial
Em 27.04.2022 a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça – STJ deu provimento ao Recurso Especial nº 1.655.705/SP (“REsp nº 1.655.705/SP”), interposto por companhia em recuperação judicial contra acórdão da 31ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP que manteve decisão, proferida pelo Juízo de primeira instância, que rejeitou a exceção de pré-executividade apresentada pela recorrente.
Em sua exceção de pré-executividade, a companhia em recuperação judicial requereu a extinção do cumprimento de sentença iniciado pela recorrida, sob a alegação de que o crédito exequendo seria concursal e estaria sujeito aos efeitos da recuperação judicial.
Nos termos do acórdão proferido pela 31ª Câmara de Direito Privado do TJSP, o crédito detido pela recorrida teria natureza extraconcursal, pois teria sido constituído com o trânsito em julgado da sentença que o reconheceu, o que ocorreu após o deferimento do processamento da recuperação judicial. Sendo assim, o crédito da recorrida não se submeteria, aos efeitos da recuperação judicial.
Em seu recurso especial, a recorrente ressaltou que o crédito detido pela recorrida foi constituído por sentença em 2008, sendo, portanto, anterior ao processamento da recuperação judicial, deferido em 29.08.2014. Nesse sentido, alegou que o crédito nasce no momento de seu fato gerador e não no momento da condenação. Logo, ainda que o trânsito em julgado da decisão que reconheceu a existência do crédito tenha sido posterior ao pedido de recuperação judicial, sua “causa constitutiva” teria sido anterior.
Nos termos do voto do Relator, Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva (“Relator”), o entendimento do Tribunal de origem quanto à extraconcursalidade do crédito destoa da jurisprudência do STJ, sedimentada em julgamento de recurso repetitivo, no qual se consolidou o entendimento de que a existência do crédito é determinada pela data que que ocorreu o seu fato gerador (cf. STJ. REsp nº 1.840.531/RS. 2ª Seção. Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. Data de julgamento: 09.12.2020. Data de publicação: 17.12.2020).
Uma vez reconhecida a concursalidade do crédito, o Relator passou a analisar se o cumprimento de sentença iniciado pela recorrida deveria ou não ser extinto no caso concreto.
Com relação ao argumento da recorrente de que o credor deve obrigatoriamente providenciar sua habilitação na recuperação judicial, o Relator entendeu que a lei não obriga o credor a habilitar o seu crédito. Trata-se de uma faculdade do credor.
Por outro lado, esclareceu que o credor não poderá prosseguir com a execução individual de seu crédito no curso da recuperação judicial, sob pena de inviabilizar o sistema recuperacional, prejudicando credores habilitados.
Especificamente, no que diz respeito à possibilidade de prosseguimento da execução individual pelo credor após o encerramento da recuperação judicial, o Relator destacou que o argumento de que o credor poderia optar por aguardar e prosseguir com a execução do valor integral do crédito após o encerramento da recuperação judicial não parece estar de acordo com a disposição do art. 49 da Lei nº 11.101/2005.
Já no que diz respeito à exclusão voluntária do crédito do âmbito da recuperação judicial por parte da recuperanda, o Relator entendeu que a possibilidade de exclusão voluntária deve se circunscrever a uma classe ou subclasse de credores, que receberão seus créditos na forma originalmente estipulada. Eventuais credores singularmente excluídos da recuperação, mas integrantes de classe sujeita ao plano, deveriam habilitar seus créditos na forma da Lei nº 11.101/2005.
Originalmente, o voto do Relator havia sido elaborado no sentido de que, nos casos em que a decisão que reconhece a submissão do crédito aos efeitos da recuperação judicial for posterior ao trânsito em julgado da sentença de encerramento da recuperação judicial, a execução deveria prosseguir pelo valor original do crédito, pois não haveria que se falar em novação pelo plano.
Entretanto, após terem sido apresentadas manifestações de voto pelos Ministros Marco Aurélio Bellizze e Luis Felipe Salomão, o Relator alterou os termos de sua fundamentação sobre esse particular.
Segundo o Relator, quer se adote o entendimento de que o encerramento da recuperação coincide com o término da fase judicial (artigo 61 da Lei nº 11.101/2005) ou de que a recuperação apenas se encerra com o pagamento integral de todas as obrigações previstas no plano de recuperação judicial, o simples prosseguimento da execução originária após o encerramento da recuperação se mostra inviável.
Assim, embora o credor não listado na relação inicial de credores não seja obrigado a se habilitar nos autos da recuperação judicial, este deverá se submeter às condições do plano aprovado pelos credores. O posterior reconhecimento da concursalidade do crédito, seja antes ou depois do encerramento da recuperação judicial, não torna o crédito em questão imune aos efeitos da recuperação judicial.
No caso concreto, o Relator concluiu que deveria ser acolhida a exceção de pré-executividade apresentada pela recorrente, com a extinção do cumprimento de sentença, facultando-se à recorrida: (i) promover a habilitação do seu crédito na recuperação judicial; ou (ii) apresentar novo pedido de cumprimento de sentença após o encerramento da recuperação judicial, devendo levar em consideração, nessa hipótese, que o seu crédito estará submetido aos efeitos do plano de recuperação judicial aprovado.
Maiores informações, bem como o inteiro teor do acórdão proferido no REsp. nº 1.655.705/SP, podem ser encontrados no site do STJ (www.stj.jus.br).
Banco Central abre consulta pública sobre proposta de regulamentação da nova lei do câmbio
Em 12.05.2022 a Diretoria Colegiada do Banco Central do Brasil (“BACEN”) aprovou a instituição da consulta pública nº 90/2022, a qual propõe a regulamentação da Lei nº 14.286/2021, que dispõe sobre o mercado de câmbio brasileiro, o capital brasileiro no exterior, o capital estrangeiro no Brasil e a prestação de informações ao BACEN (“Consulta Pública”).
Conforme noticiado pela Newsletter Moreira Menezes, Martins Advogados nº 88 (janeiro de 2022), a edição da Lei nº 14.286/2021 decorreu da necessidade de modernização, simplificação e consolidação da legislação referente ao mercado de câmbio brasileiro. Desse modo, além de introduzir novas regras aplicáveis ao mercado de câmbio, a Lei nº 14.286/2021 também revogou e alterou diversos dispositivos já existentes que tratavam do tema.
O edital da Consulta Pública destaca as seguintes principais propostas de alterações da regulamentação do mercado de câmbio:
(i) permissão do uso de critérios próprios da instituição autorizada para requisitar ou dispensar a documentação acessória para o curso das operações cambiais, observados os riscos associados à operação, considerando a avaliação do cliente e as características da operação;
(ii) simplificação e racionalização do processo de classificação da finalidade das operações cambiais, considerando que a Lei nº 14.286/2021 estabelece que a indicação da finalidade deverá ser efetuada pelo cliente. Antes da edição da referida lei, o agente responsável por informar a finalidade das operações cambiais eram as instituições autorizadas a operar no mercado de câmbio;
(iii) permissão para a realização de operações de câmbio em livre formato, observado que, no caso de operação com cliente, a instituição autorizada a operar no mercado de câmbio deve ser capaz de comprovar perante o BACEN que as partes têm conhecimento das informações referentes à operação e que consentem com as condições pactuadas;
(iv) eliminação do impedimento para alocação, investimento e destinação para operação de crédito e de financiamento, no país e no exterior, dos recursos captados no país e no exterior pelas instituições financeiras e as demais instituições autorizadas a funcionar pelo BACEN, desde que observados requisitos regulatórios e prudenciais estabelecidos pelo Conselho Monetário Nacional e pelo BACEN. Atualmente, as instituições autorizadas pelo BACEN apenas podem aplicar suas disponibilidades em moeda estrangeira nos seguintes ativos: (iv.1) títulos soberanos brasileiros ou estrangeiros; (iv.2) títulos de instituições financeiras; e (iv.3) depósitos a prazo em instituições financeiras;
(v) uniformização dos requisitos para abertura, manutenção e movimentação de contas em reais titularizadas por não residentes com os requisitos aplicáveis às contas de titularidade de residentes, observado o seguinte: (v.1) necessidade de manutenção das referidas contas em instituição autorizada a operar no mercado de câmbio; (v.2) prestação de informações em base mensal para movimentações acima de R$ 1 milhão, para operações sujeitas a registro de capitais estrangeiros e para contas titularizadas por embaixadas e legações estrangeiras; (v.3) limite de R$ 100 mil por movimentação no caso de conta de pagamento; e (v.4) impedimento ao uso para movimentação de interesse de terceiros, salvo nos casos em que a conta titularizada por instituição não residente for sujeita à regulação e à supervisão financeira no país de origem. Diante disso, propõe-se que sejam revogadas as exigências de cadastro prévio dessas contas no BACEN, bem como as exigências de prestação de informações no caso de movimentações acima de R$ 100 mil ou sujeitas a registro de capitais estrangeiros; e
(vi) substituição do atual indicador de juros externos para o cálculo do encargo financeiro incidente sobre o valor em reais adiantado ao cliente no caso de cancelamento e baixa de operações de câmbio de compra de moeda estrangeira. Também será estabelecida a dispensa de seu recolhimento no caso de cancelamento ou baixa de até US$ 10.000,00, ou equivalente em outra moeda, desde que seu somatório não represente mais de 10% do valor total da compra de moeda estrangeira. Atualmente, o encargo pode ser cobrado sobre o valor cancelado ou baixado, independentemente de haver adiantamento em reais para o cliente.
No âmbito da Consulta Pública, são submetidas à análise dos participantes do mercado 4 minutas de resoluções que tratam dos seguintes temas:
(i) estabelecer diretrizes que devem ser observadas para a realização das operações no mercado de câmbio, compreendendo também o ingresso ou a saída de reais e moeda estrangeira do país por meio de instituição autorizada a operar no mercado de câmbio;
(ii) dispor sobre o encargo financeiro que recai sobre vendedor de moeda estrangeira diante do cancelamento ou a baixa na posição de câmbio referente a contrato de compra de moeda estrangeira que ampare adiantamento em reais, instituído pelo §2º do art. 7º da Lei nº 14.286/2021;
(iii) regulamentar a Lei nº 14.286/2021, em relação ao mercado de câmbio e ao ingresso e à saída do País de valores em reais e em moeda estrangeira; e
(iv) regulamentar o art. 1º da Lei nº 14.286/2021, em relação às definições de “residente” e de “não residente” a ser aplicada para pessoas físicas e jurídicas.
Sugestões e comentários deverão ser encaminhados até o dia 01.07.2022, por meio do formulário eletrônico indicado no edital da Audiência Pública no site do BACEN (www.bcb.gov.br).
Maiores informações, bem como o texto integral das minutas, podem ser encontrados no site do BACEN (www.bcb.gov.br).
STJ veda a fixação de honorários por equidade quando os valores da condenação, da causa ou do proveito econômico forem elevados
Em 31.05.2022 foram publicados no Diário da Justiça Eletrônico os acórdãos proferidos pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça – STJ, no julgamento dos Recursos Especiais nos 1.850.512/SP, 1.877.883/SP e 1.906.623/SP e 1.906.618/SP, todos afetados para julgamento sob a sistemática dos recursos repetitivos, conforme os arts. 1.036 e 1.037 do Código de Processo Civil (“CPC”), para que fosse submetido a julgamento o Tema Repetitivo nº 1.076, definindo-se o “alcance da norma inserta no § 8º do artigo 85 do Código de Processo Civil nas causas em que o valor da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados”.
Desse modo, a Corte Especial do STJ firmou a seguinte tese jurídica:
“i) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC – a depender da presença da Fazenda Pública na lide –, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa.
ii) Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo.”
De acordo com o voto vencedor, proferido pelo Relator Ministro Og Fernandes (“Ministro Relator”), acompanhado por maioria na Corte Especial do STJ, o art. 85, § 8º do CPC determina que a fixação dos honorários por apreciação equitativa somente é possível nas causas cujo proveito econômico for inestimável ou irrisório, ou quando o valor da causa for muito baixo, posicionamento que já havia sido manifestado no Enunciado nº 6 da I Jornada de Direito Processual Civil do Conselho da Justiça Federal.
Segundo o Ministro Relator, o termo “valor inestimável” empregado pelo CPC, refere-se às causas em que não é possível atribuir um valor patrimonial à lide, como pode ocorrer, por exemplo, nas ações que envolvem direito ambiental ou direito de família. Dessa forma, como consignado pelo Ministro Relator, não se deve confundir “valor inestimável” com “valor elevado”.
O Ministro Relator afirmou, ainda, que a vedação ao arbitramento de honorários por equidade nas causas de valor elevado prevista no CPC decorreu de uma reação das associações de advogados à norma do art. 20, § 4º do Código de Processo Civil de 1973 que permitia a fixação de honorários por apreciação equitativa nas causas em que a Fazenda Pública fosse vencida. Sobre esse ponto, o Ministro Relator destacou que a atuação de categorias profissionais no processo legislativo, em defesa dos interesses de seus membros, faz parte do jogo democrático e do funcionamento normal das instituições.
Quanto à preocupação de que condenações em honorários nas causas em que a Fazenda Pública for vencida possam resultar em prejuízo excessivo ao erário público, o Ministro Relator ressaltou que a jurisprudência do STJ está pacificada no sentido de que os honorários contra a Fazenda Pública devem ser fixados em observância aos parâmetros estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85 do CPC.
Considerou, ainda, que a vedação ao arbitramento de honorários por equidade nas causas de valor elevado em que a Fazenda Pública for derrotada pode servir como um desestímulo ao ajuizamento de execuções fiscais sem possibilidade de êxito, que acabam extintas por motivos previsíveis, tais como ilegitimidade passiva, cancelamento da certidão de dívida ativa ou reconhecimento da prescrição do crédito tributário.
Nesse sentido, apontou-se como dever dos advogados — tanto públicos quanto privados — lançar um olhar crítico sobre a viabilidade e probabilidade de êxito da demanda antes de iniciá-la, com o objetivo de promover uma litigância responsável.
Em síntese, é possível extrair as seguintes conclusões do Tema Repetitivo nº 1.076 do STJ:
(i) em regra, nas demandas em que a parte vencida seja um particular, os honorários sucumbenciais devem ser fixados nos termos do art. 85, § 2º do CPC, entre o mínimo de 10% e o máximo de 20% sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, em função dos seguintes critérios, listados nos incisos I a IV: (i.1) o grau de zelo do profissional; (i.2) o local de prestação do serviço; (i.3) a natureza e a importância da causa; e (i.4) o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço;
(ii) em regra, nas demandas em que a parte vencida seja a Fazenda Pública, além dos critérios dos incisos I a IV do § 2º do art. 85 do CPC, também devem ser observados os parâmetros objetivos do § 3º do mesmo artigo; e
(iii) excepcionalmente, nas causas cujo proveito econômico for inestimável ou irrisório ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o § 8º do art. 85 do CPC determina que os honorários sejam fixados por apreciação equitativa, devendo ainda assim ser observado o disposto nos incisos I a IV do § 2º.
Por fim, deve-se ressaltar que o § 8º-A, introduzido recentemente no art. 85 do CPC pela Lei nº 14.365/2022, estabelece que, na hipótese do § 8º, para fins de fixação equitativa de honorários, o juiz deverá observar os valores recomendados pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil a título de honorários advocatícios, ou o limite de 10% estabelecido no § 2º, aplicando-se o que for maior.
Acompanharam o voto vencedor do Ministro Relator os Ministros Jorge Mussi, Mauro Campbell Marques, Luis Felipe Salomão, Benedito Gonçalves, Raul Araújo e João Otávio de Noronha. Por sua vez, restaram vencidas as Ministras Nancy Andrighi, Laurita Vaz, Maria Thereza de Assis Moura e Maria Isabel Gallotti e o Ministro Herman Benjamin.
Os acórdãos ainda não transitaram em julgado.
Maiores informações, bem como o inteiro teor dos acórdãos, podem ser encontrados no site do STJ (www.stj.jus.br).
Jurisprudência
Superior Tribunal de Justiça
CIVIL. LOCAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO RENOVATÓRIA DE CONTRATO DE LOCAÇÃO COMERCIAL. AUSÊNCIA DE NEGATIVA DA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. PRETENSÃO DO LOCADOR DE VER REPETIDO O PRAZO DO CONTRATO ORIGINAL. IMPOSSIBILIDADE. PRAZO MÁXIMO DE PRORROGAÇÃO DE CINCO ANOS. RECURSO DESPROVIDO.
1. Em sede da ação renovatória de locação comercial prevista no art. 51 da Lei 8.245/91, o prazo máximo de prorrogação contratual será de cinco (5) anos. Assim, ainda que o prazo da última avença supere o lapso temporal de cinco anos, a renovação compulsória não poderá excedê-lo, porquanto o quinquênio estabelecido em lei é o limite máximo.
2. Recurso especial a que se nega provimento.
(STJ. 4ª Turma. REsp nº 1.990.552/RS. Rel.: Min. Raul Araújo. Data de julgamento: 17.05.2022. Data de publicação: 26.05.2022).
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CITAÇÃO. PESSOA JURÍDICA. MUDANÇA DE ENDEREÇO COMUNICADA À JUNTA COMERCIAL. AUSÊNCIA DE ATUALIZAÇÃO DO ENDEREÇO NO SÍTIO ELETRÔNICO DA INTERNET. CARTA CITATÓRIA ENTREGUE NO ENDEREÇO ANTIGO. NULIDADE. RECONHECIMENTO. INAPLICABILIDADE DA TEORIA DA APARÊNCIA NA HIPÓTESE.
1. Controvérsia em torno da validade da citação de pessoa jurídica em seu antigo endereço, cuja mudança fora comunicada à Junta Comercial, mas sem alteração no sítio eletrônico da empresa.
2. Extrema relevância da regularidade formal do ato citatório por sua primordial importância na formação da relação processual.
3. Não preenchimento dos requisitos para aplicação da teoria da aparência.
4. Precedentes da Terceira Turma do STJ.
5. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
(STJ. Terceira Turma. REsp nº 1.976.741/RJ. Rel.: Min. Paulo de Tarso Sanseverino. Data de julgamento: 26.04.2022. Data de publicação: 03.05.2022).
CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. OBRIGAÇÃO DE FAZER COM CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. CONTRATO VERBAL SEM DETERMINAÇÃO DE PRAZO. PRESCRIÇÃO DECENAL. TERMO INICIAL. DATA DA NOTIFICAÇÃO. RECURSO PROVIDO.
1. Aplica-se o NCPC a este julgamento ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.
2. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça definiu que nas pretensões relacionadas a responsabilidade contratual, se aplica a regra geral (art. 205 do CC/2002), que prevê dez anos de prazo prescricional, e, nas demandas que versarem sobre responsabilidade extracontratual, aplica-se o disposto no art. 206, § 3º, V, do mesmo diploma, com prazo prescricional de três anos.
3. O termo a quo do prazo prescricional está diretamente relacionado ao surgimento do interesse processual para a propositura da ação; enquanto não houver interesse, condição da ação, não se inicia a prescrição.
4. Na falta de predeterminação de data para o cumprimento da obrigação, é necessário constituir o devedor em mora, para então surgir a pretensão de cobrança.
5. Na espécie, proposta a ação antes de findo o prazo decenal após a notificação dos devedores, deve ser afastada a prescrição.
6. Recurso especial provido.
(STJ. Terceira Turma. REsp nº 1.758.298/MT. Rel.: Min. Moura Ribeiro. Data de julgamento: 03.05.2022. Data de publicação: 05.05.2022).
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