Newsletter nº 102 | Março 2023

Nesta edição:

ANPD publica Regulamento de Dosimetria e Aplicação de Sanções Administrativas

Em 27.02.2023 a Autoridade Nacional de Proteção de Dados – ANPD editou a Resolução CD/ANPD nº 04/2023, que aprova o Regulamento de Dosimetria e Aplicação de Sanções Administrativas (“Regulamento”).

O Regulamento fixa os parâmetros e critérios para aplicação, pela ANPD, de sanções administrativas pecuniárias e não pecuniárias no julgamento de infrações administrativas de sua competência, bem como estabelece as formas e dosimetrias para o cálculo do valor-base das sanções de multa.

Com a edição do Regulamento, agentes de tratamento de dados que descumprirem obrigações previstas na Lei nº 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais – LGPD) ou na regulamentação editada pela ANPD estarão sujeitos às sanções administrativas estabelecidas no Regulamento. 

O Regulamento tem por objetivo assegurar proporcionalidade entre a sanção aplicada e a gravidade da conduta do agente, estipulando correspondência entre o tipo de infração cometida e a penalidade imposta. Para tanto, os diversos tipos de infrações são classificadas como grave, média ou leve, da seguinte maneira:

(i) as infrações leves são aquelas que não se enquadram na definição de infrações médias ou graves;

(ii) as infrações médias são aquelas em que o tratamento de dados impede ou limita, de maneira significativa, o exercício de direitos ou a utilização de um serviço, ou ocasiona danos materiais ou morais aos titulares de tais dados; e

(iii) as infrações graves são aquelas em que constituem uma obstrução à atividade de fiscalização ou que, além de estarem presentes os requisitos de uma infração média, também envolvam (iii.1) o tratamento de dados pessoais em larga escala, (iii.2) a obtenção ou pretensão de auferir vantagem econômica pelo infrator em decorrência da infração cometida; (iii.3) o risco à vida dos titulares de dados; (iii.4) o tratamento de dados sensíveis ou de dados pessoais de crianças, de adolescentes ou de idosos; (iii.5) o tratamento de dados pessoais sem amparo em uma das hipóteses legais previstas na LGPD; (ii.6) o tratamento de dados com efeitos discriminatórios ilícitos ou abusivos; ou (ii.7) a adoção sistemática de práticas irregulares pelo infrator.

As penalidades aplicadas pela ANPD poderão consistir em: advertência, multa, publicização da infração, suspensão ou eliminação de dados pessoais de uma determinada base ou a proibição parcial ou total do exercício de atividades relacionadas a tratamento de dados. 

Tais penalidades serão aplicadas de acordo com as peculiaridades de cada caso e após o exercício de ampla defesa pelo acusado. Na definição das sanções, serão considerados os seguintes critérios e parâmetros: a gravidade e a natureza das infrações e dos direitos pessoais afetados; a boa-fé do infrator; a vantagem auferida ou pretendida pelo infrator; a condição econômica do infrator; a reincidência específica; a reincidência genérica; o grau do dano; a cooperação do infrator; a adoção reiterada e demonstrada de mecanismos e procedimentos internos capazes de minimizar o dano, voltados ao tratamento seguro e adequado de dados, em consonância com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais – LGPD; a adoção de política de boas práticas e governança; a pronta adoção de medidas corretivas; e a proporcionalidade entre a gravidade da falta e a intensidade da sanção.

O Regulamento entrou em vigor na data de sua publicação.

Maiores informações, bem como a íntegra do Regulamento, podem ser encontradas no site da ANPD (www.gov.br/anpd/pt-br).

CVM divulga Ofício Circular Anual para companhias

Em 28.02.2023 a Superintendência de Relações com Empresas – SEP da Comissão de Valores Mobiliários – CVM divulgou o Ofício Circular/Anual-2023-CVM/SEP (“Ofício SEP de 2023”), que consolida as orientações da SEP sobre procedimentos a serem observados na prestação de informações periódicas e eventuais pelas companhias abertas, estrangeiras e incentivadas, além de contemplar a interpretação da SEP e do Colegiado da CVM sobre a legislação e regulamentação aplicáveis às práticas reguladas pela Autarquia.

O objetivo da SEP com a elaboração do Ofício SEP de 2023 é fomentar a divulgação das informações societárias de acordo as melhores práticas de governança corporativa, visando a transparência e a equidade no relacionamento das companhias com os investidores e com o mercado. Ao mesmo tempo, busca-se minimizar eventuais desvios e, consequentemente, reduzir a necessidade de formulação de exigências e a aplicação de multas cominatórias ou outras penalidades aos participantes do mercado.

O Ofício SEP de 2023 contempla as seguintes inovações em relação aos dos anos anteriores:

(i) cancelamento voluntário de registro de companhias securitizadoras: para as companhias securitizadoras, registradas nos termos da Resolução CVM nº 60/2021 e que possuam apenas títulos de securitização em circulação, o eventual cancelamento do registro de tais companhias na categoria B pode ocorrer com a dispensa do atendimento ao requisito previstos no art. 51,. I, Resolução CVM nº 80/2022 (inexistência de valores mobiliários em circulação);

(ii) envio dos informes de companhias securitizadoras: o Ofício SEP de 2023 passou a prever que o envio dos informes das companhias securitizadoras (registradas nas categorias S1 ou S2), assim como das demais informações periódicas e eventuais de tais sociedades, deve ser realizado, exclusivamente, por meio do “Sistema Fundos.NET”. Adicionalmente, caso a companhia securitizadora também mantenha o registro de companhia aberta, deverá enviar os documentos pertinentes pelo “Sistema Empresas.NET”;

(iii) voto plural e composição de órgãos de administração de companhias abertas: o Ofício SEP de 2023 passou a refletir as alterações no arcabouço regulatório do mercado de capitais introduzidas pela Resolução CVM nº 168/2022 (que trata de aspectos relacionados ao voto plural e composição de órgãos de administração nas companhias abertas, conforme noticiado pela Newsletter Moreira Menezes, Martins nº 97, em outubro de 2022); e

(iv) nova estrutura do Formulário de Referência de companhias abertas: em 2022, a estrutura do Formulário de Referência passou por reformulação, com o objetivo de reduzir os custos de observância incorridos pelas companhias abertas durante a elaboração do referido documento. Além disso, a nova estrutura do Formulário de Referência inaugura novo paradigma no que se refere à exigência de divulgação de informações relacionadas aos fatores ambiental, social e de governança (ESG) sob o modelo de “pratique ou explique”. 

A SEP recomenda, ainda, a leitura dos seguintes documentos, além do Ofício Anual de 2023: (i) com relação a matérias contábeis, a leitura dos Ofícios Circulares/SNC/SEP; (ii) quanto às demais matérias, leitura dos Ofícios Circulares emitidos pelas superintendências da CVM, em especial aqueles emitidos em conjunto com a SEP; (iii) no que se refere à regulamentação emitida pela CVM, a leitura dos relatórios das audiências e consultas públicas; (iv) quanto às melhores práticas de governança corporativa, a leitura do Código Brasileiro de Governança Corporativa; e (v) quanto à divulgação e à utilização de informações, visando contribuir para evitar a ocorrência de casos de insider trading no mercado de capitais brasileiro, a leitura do Guia de Recomendações e Boas Práticas para a Prevenção ao Insider Trading.

Maiores informações, bem como a íntegra do Ofício SEP de 2023, podem ser encontradas no site da CVM (www.gov.br/cvm).

B3 moderniza regras de free float para os seguimentos especiais de listagem

Em 01.02.2023 a B3 S.A. – Brasil, Bolsa, Balcão divulgou o Ofício Circular nº 013/202-PRE, que tem por objeto a divulgação da aprovação, pela Comissão de Valores Mobiliários – CVM, das alterações propostas nos Regulamentos dos segmentos Nível 1, Nível 2 e do Novo Mercado da B3 (em conjunto, “Segmentos Especiais”) no que diz respeito ao parâmetro mínimo de liquidez (i.e., ações em circulação ou “free float”) e volume médio diário de negociação (ADTV) para listagem e permanência nos Segmentos Especiais.

Dentre as alterações promovidas nos Regulamentos dos Segmentos Especiais, destacam-se as seguintes: 

(i) percentual mínimo de free float: anteriormente, o percentual mínimo de free float exigido pelos Regulamentos dos Segmentos Especiais era de 25% do total do capital social da companhia. Com as alterações aprovadas, esse percentual foi reduzido para 20%. Além dessa regra geral, a possibilidade de manutenção do free float em patamar de 15% do capital social da companhia em hipóteses específicas, antes possível apenas no Novo Mercado, foi ampliada para todos os Segmentos Especiais; 

(ii) volume financeiro em caso de oferta pública de distribuição: na hipótese de listagem concomitante à realização de oferta pública de valores mobiliários, o volume financeiro mínimo, antes de R$ 3 bilhões, passa a ser (ii.1) igual ou superior a R$ 2 bilhões; (ii.2) inferior a R$ 2 bilhões e igual ou superior a R$ 1,5 bilhão, desde que o estatuto social da companhia preveja a redução de quóruns para o exercício de determinados direitos pelos acionistas minoritários, bem como seja eleito um conselheiro independente adicional; ou (ii.3) inferior a R$ 1,5 bilhão e igual ou superior a R$ 1 bilhão, desde que, além da previsão no estatuto social da companhia de redução de quóruns e eleição de conselheiro independente adicional, também ocorra a implementação de medida para promoção da liquidez das ações em circulação; e

(iii) volume médio diário de negociação (ADTV): o ADTV de negociação das ações da companhia deve manter-se igual ou superior a R$ 20 milhões, diferentemente dos R$ 25 milhões vigentes até então, considerados os negócios realizados nos últimos 12 meses.

Cumpre destacar que, anteriormente à aprovação pela Comissão de Valores Mobiliários, as alterações mencionadas acima foram debatidas em Audiência Pública realizada pela B3 em outubro de 2021 e em Audiência Restrita realizada em abril de 2022, além de deliberadas entre as companhias que compõem cada Segmento Especial. 

As alterações promovidas nos Regulamentos dos Segmentos Especiais entraram em vigor no dia 31.01.2023.

Maiores informações, bem como a íntegra do Ofício Circular nº 013/202-PRE, podem ser encontradas no site da B3 (www.b3.com.br).

STJ determina a impossibilidade de emissão de certidão de regularidade fiscal da filial se houver dívida da sede

Em 02.03.2023 no julgamento do Embargos de Divergência em Agravo em Recurso Especial nº 2.025.237/GO, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça – STJ resolveu divergência anteriormente existente entre as 1ª e a 2ª Turmas do Tribunal, ao decidir a administração tributária não deve emitir Certidão Negativa de Débitos ou Certidão Positiva com Efeito de Negativa em nome de filial de sociedade, na hipótese em que há pendência fiscal oriunda da sede ou de outra filial da mesma sociedade. 

Os Embargos de Divergência foram interpostos pela Fazenda Nacional contra acórdão prolatado pela 2ª Turma do STJ, no qual foi decidido que, possuindo a sede inscrição no CNPJ diversa da filial, a existência de débito fiscal em nome de um estabelecimento não impediria a expedição de certidão de regularidade fiscal em favor do outro. 

Para fins de demonstração da divergência suscitada, a Fazenda Nacional recorreu ao entendimento da 1ª Turma do STJ, segundo o qual as filiais são estabelecimentos secundários da mesma pessoa jurídica, sendo desprovidas de personalidade jurídica e patrimônio próprios. Dessa forma, existiria relação de dependência entre a sede e a filial a impedir a expedição da certidão de regularidade de um dos estabelecimentos quando houvesse dívida fiscal do outro.

No âmbito da resolução da divergência, a Ministra Relatora destacou o seguinte em seu voto:

(i) tendo em vista a ausência de personalidade jurídica própria da filial, a regularidade fiscal apta à obtenção de Certidões Negativas de Débito ou Certidões Positivas com Efeitos de Negativa envolve a integralidade das pendências fiscais a cargo da entidade detentora de personalidade jurídica, sejam tais pendências relativas à sede ou a qualquer de suas filiais;

(ii) o fato de a filial estar inscrita sob número de CNPJ diverso da sede é insuficiente para afastar a unidade da pessoa jurídica de direito privado;

(iii) a comunhão de esforços entre as unidades operacionais de uma sociedade empresária – sede e filial – no desenvolvimento de suas atividades exige a cultura da conformidade fiscal, que está relacionada ao comprometimento com a transparência da pessoa jurídica integralmente considerada; e

(iv) apesar da evidente autonomia operacional e administrativa entre os estabelecimentos, a emissão de certidões de regularidade fiscal se insere na seara jurídica da empresa integralmente considerada (i.e., atividade empresária) e não se restringe ao estabelecimento.

Maiores informações, bem como a íntegra do acórdão, podem ser encontradas no site do STJ (www.stj.jus.br).

Jurisprudência

Superior Tribunal de Justiça

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SUSPENSÃO DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. AUSÊNCIA DE BENS PASSÍVEIS DE EXECUÇÃO. INÉRCIA DO EXEQUENTE POR SIGNIFICATIVO PERÍODO DE TEMPO. BOA-FÉ OBJETIVA. “SUPRESSIO”. NÃO OCORRÊNCIA. DISTINÇÃO. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DA SUSPENSÃO DA FLUÊNCIA DE JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA DURANTE A SUSPENSÃO DO PROCESSO. INEXISTÊNCIA DE OFENSA À COISA JULGADA. RECURSO PROVIDO.

1. Inexiste afronta aos arts. 489 e 1.022 do CPC/2015 quando a Corte local se pronunciou, de forma clara e suficiente, acerca das questões suscitadas nos autos, manifestando-se sobre todos os argumentos que, em tese, poderiam infirmar a conclusão adotada pelo Juízo.

2. O princípio da não surpresa não impede a requalificação jurídica do enquadramento fático circunscrito na causa de pedir da demanda, em relação ao qual houve o necessário contraditório, defluindo do princípio jura novit curia.

3. A supressio consubstancia-se na impossibilidade de se exercer um direito por parte de seu titular em razão de seu não exercício por certo período variável de tempo e que, em razão desta omissão, gera da parte contrária uma expectativa legítima de que não seria mais exigível. Não se confunde, ademais, com a prescrição e com a decadência, institutos pelos quais se opera a extinção da pretensão ou do direito potestativo pela simples passagem do tempo.

4. A suspensão do cumprimento de sentença, em virtude da ausência de bens passíveis de excussão, por longo período de tempo, sem nenhuma diligência por parte do credor, não pode dar ensejo à suspensão da fluência dos juros e da correção monetária pela configuração da supressioporquanto a pendência da ação que busca a concretização do título judicial impede que se gere no devedor a expectativa de inexigibilidade do débito.

5. Ainda que fosse possível o reconhecimento da supressio, não ocorreria vulneração da coisa julgada e tampouco do princípio pacta sunt servanda, porquanto o instituto da supressio e outros deveres anexos e encargos que circundam e decorrem da boa-fé objetiva situam-se em momento posterior à formação da relação jurídica e interferem em seu exercício.

6. Recurso especial provido.

(STJ. 4ª Turma. REsp nº 1.717.144/SP. Rel.: Min. Antonio Carlos Ferreira. Data de julgamento: 14.02.2023. Data de publicação: 28.02.2023)

A Newsletter Moreira Menezes, Martins Advogados é uma publicação exclusivamente informativa, não devendo ser considerada, para quaisquer fins, como opinião legal, sugestão ou orientação emitida pelo Escritório.

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